quinta-feira, dezembro 21, 2006

Porque hoje é quinta-feira

O Silva, sem bater, abriu a porta e entrou no quarto do motel. Lá dentro sentada na cama estava já a Socretina a fumar um cigarro.
- Chegaste atrasado. Houve problemas.
- A Maria hoje não se calava e tive de lhe ir tirar a caixa dos enfeites de Natal que estava numa prateleira alta. Há dias que me andava a falar disso.
- Pensei que tinhas demorado mais porque tinhas ficado a mandar a lei das finanças Locais para o Tribunal Constitucional – disse a Sócretina num tom desafiador.
- Não me digas que estás chateada com isso? Não tem problema nenhum e sabes que eu nisto tinha de salvar as aparências – dizia o Silva enquanto se passeava pelo quarto nervosamente.
- Claro que compreendo, tu tinhas de pensar em ti e no teu cadeirão lá de Belém. Eu sei.
Acendeu mais um cigarro enquanto cruzava a perna.
- Pronto, estás chateada.
- Não estou nada. Tu fazes o que queres, não tenho nada a ver com isso.
- Olha – disse o Aníbal – Tu compraste uns pareceres a dizer que aquilo era tudo constitucional para usares nas discussões, não compraste?
- Sabes bem que sim. E, olha que foram bem caros. Comprei 5 e toma lá150 mil euros.
- Porra que esses gajos estão careiros. Se calhar devia ter tirado o curso de direito em vez do de economia. – Disse o Silva sorrindo.
- És muito engraçadinho.
Sentando-se ao lado da Sócretina, pegou-lhe na mão.
- Vamos então fazer assim: eu ajudo-te a escrever uma carta e depois tu juntas os pareceres e mandas tudo lá para o tribunal. Vais ver que não vão levantar problemas.
- Isso é muito bonito. - disse a Sócretina zangada – Se eles dizem não, eu é que fico mal, não é? Tu estás assim calmo porque de uma maneira ou de outra sais sempre bem. Eu é que me lixo.
-Vais ver que tudo vai correr bem. Agora anda cá que não quero discutir mais. Chega-te a mim.
-Tu só pensas nisso. Os homens são todos iguais.
O Silva, que se tinha levantado, sorriu e dirigiu-se à janela abanando a cabeça. Esticou o braço e baixou o estore. Nós, que estávamos cá fora, enregelados com o frio, lá ficámos a olhar para uma janela escura. Talvez para a semana tenhamos melhor sorte.


Contribuição para o Echelon: Kwajalein, LHI

18 comentários:

  1. Estes dois encontram-se num motel mas que se F#)& somos nós...
    Mais um diálogo brilhante.
    Um Abraço.

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  2. E esta será,por certo, a versão soft dos acontecimentos...

    Ah,o amor...esse fogo que arde...

    Amor é fogo que arde sem se ver;
    É ferida que dói e não se sente;
    É um contentamento descontente;
    É dor que desatina sem doer;

    É um não querer mais que bem querer;
    É solitário andar por entre a gente;
    É nunca contentar-se de contente;
    É cuidar que se ganha em se perder;

    É querer estar preso por vontade;
    É servir a quem vence, o vencedor;
    É ter com quem nos mata lealdade.

    Mas como causar pode seu favor
    Nos corações humanos amizade,
    Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

    Será que o casal se entrega à prática da lírica camoniana?

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  3. melhor sorte, só mesmo se forem surpreendidos pela Maria de caçadeira de canos serrados em punho...

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  4. enquantos uns dão uma machadinha no matrimónio, outros dão uma machadada em todos nós. Isso é que não me está a "PARECER" justo! Eu falei em Pareceres???? :O)
    Tem o resto de um bom dia Kaos

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  5. outsider:
    Pois é, mas quem goza são eles.
    abraço

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  6. Jorge:
    Aqui liricos somos só nós, que ainda acreditamos que esta gente possa fazer algo pelo país. Estes sim cantam bem a canção do bandido.
    abraço

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  7. Rui:
    essa era bonita. Com um cutelo ensanguentado nas mãos também não ficava mal.
    abraço

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  8. gi:
    Realmente já estamos bem sangrados por esta gente. Como dizia o saudoso Zeca Afonso no seu "Vampiros"
    Eles comem tudo. Eles comem tudo.
    Eles comem tudo e não deixam nada.
    bjs

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  9. Sim Senhor, muito bem escrito! Está fantastico!

    Abraço

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  10. Mas é mesmo verdade que estes dois andam...enfim...a enganar a Maria?
    E ainda por cima num motel! Já não há moral nem costumes decentes! Brrrrr!

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  11. Olá Dml:
    Obrigado e bem vindo
    abraço

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  12. Porca:
    A vida está dificil para todos.
    abraço

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  13. Diacono bentinho:
    São como unha e carne. Um diz mata e o outro logo esfola.
    abraço

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  14. luikki:
    Eu acredito nisso que ela não é de confiança.
    abarço

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  15. Pois é...num motel que a maria anda sempre a meter o bedelho...essa menina está amuada mas deve ter algo na manga.... Como sempre bons diálogos. :)
    jinhos

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  16. Parece que ninguém se enganou: o namoro pegou mesmo... E irá longe...

    Mas...

    C'o estore fechado, como vamos ver o resto da novela?

    Há sempre uns que espreitam... E vão dando notícias.

    Nem é preciso grande imaginação para ver em que vai acabar esta brincadeira...

    Boa cena, Kaos!

    JL

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  17. tb:
    Foi no Motel porque a Maria andava e enfeitar a maison com os sininhos e os anjinhos. Não para quieta e entra em todo o lado.
    bjs

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  18. jlf:
    Ainda nãp conseguimos colocar um espião dentro do quarto, mas estamos a tratar disso. Quem sabe um dia não relatamos tudo até à consumação do acto.
    abraço

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