segunda-feira, março 13, 2006

Vasco vs Clara – Amor de Perdição

Inspirado no quadro de Paula Rego
Vasco Pulido Valente zurze ou adula implacavelmente . Nesse zurzir repleto de todos os estilos literários, pretende comentar o carácter humano e destila uma sangria narcísica num funcionamento esquizo-paranóide ( daí a sua necessidade de investigar as contradições do carácter humano dos outros). Ou seja, como alguém já referiu, verdadeira sopeirice intelectual, adornada por um estilo tipo conselheiro Acácio.
Esta semana zurziu furiosamente em Clara Ferreira Alves ( num Blog com existência meteórica “ O ESPECTRO “ – construído com a colaboração da inefável esposa) acusando-a de oportunismo e carreirismo, num acto de amnésia face às suas aproximações ambivalentes ao espaço político . Na sua coerência, esqueceu a sua incursão no PSD e o seu papel de emplastro enquanto alter secretário de estado da cultura e como deputado ( isto comparado com a história da Casa Fernando Pessoa !).
Pouco Polido amnésico e nada Valente !
Sobre os portugueses a verborreia doutoral de VPV destila assim:
Os portugueses, para serem modernos, não são «machistas». Só são «machistas» quando abrem a boca. (...) Basta raspar um português para encontrar um fadista ou um moço-de-forcados. Tudo passa sobre nós sem tocar no caroço: a democracia, a «Europa», a civilização. O disfarce parece convincente. Só que, às vezes, sem ninguém esperar, salta cá para fora um esguicho do verdadeiro génio do indígena
VPV in DN

VPV – o verdadeiro caroço da civilização !

Contudo, a Clarinha depois daquele artigo da viajem natalícia ao Brasil ( por 500 mocas para não se misturar com a escumalha) andava a pedi-las !
Nada melhor para a caracterizar que “UMBIGO Dixit”

“Primeiro problema: há um enorme abismo entre o que és (uma jornalista «que escreve bem») e o que gostarias de ser (um grande vulto da literatura). E tu sabes isso. A impiedosa Clara-cronista será sempre demasiado severa para com a virtual Clara-escritora. É esse o motivo pelo qual a retumbante novela que guardas há anos nas gavetas da tua imaginação jamais verá a luz do dia. É pena, porque com jeitinho talvez conseguisses escrever uma coisa parecida com o «Equador», para vender bem no Verão e levar para a praia. O teu drama é que querias um «Nostromo» ou uns bons «Karamazov» (2 volumes, tradução directa do bielorusso de Nina e Filipe Guerra, Lda.). Achas que, com o que já leste na vida, tens direito a não menos que isso. O teu talento é a tua tragédia. Com a fama que já tens, tudo o que escrevesses seria sempre «vocês têm o último da Clara Ferreira Alves? Não me lembro do nome». Resumindo: estavas três meses nos tops da Fnac e o resto dos teus dias na ignóbil poeira do esquecimento. Não é isso, em absoluto, o que almejavas. O teu sonho era escrever uma obra de génio numa mansarda tuberculosa de Dublin, vivendo do ar, cafés e cigarros, saindo directamente do anonimato para as páginas do The Western Canon. O problema é que já és demasiado famosa para isso. Tens, portanto, de ir convivendo com personalidades literárias como o Dr. Pedro Miguel Santana Lopes e programas como o Eixo do Mal, para ganhares o que a tua pulsão consumista reclama.

Segundo problema: a tua pluma é polifónica. Saltitas entre um número variado de registos, do género «colecção Anita» («Anita na Praia», «Anita, Grávida Adolescente», «Anita no Jardim Zoológico», «Anita Vai ao Circo», «Anita no Private Banking», «Anita e o Ouricinho-Cacheiro», «Anita e a Co-Incineração», «Anita no Ballet», «Anita e as Obrigações de Curto Prazo», «Anita Fuma a Primeira Ganza», «Anita na Montanha», «Anita Já Dá Para a Veia»).

Assim, temos:

Clara, Íntima dos Grandes Escritores - «nessas noites loucas do English Bar, em que o Zé Cardoso Pires, cigarro atrás de cigarro, falava a língua de trapos dos marinheiros de Conrad e me ensinava a distinguir as tonalidades dos maltes»; «foi então que o Al Berto se pôs a uivar à porta do Frágil, comme un chien andalou»; «a Pilar deu um soporífero ao José e lá fomos as duas ver a última colecção da Prada e beber um copo num bar de strip masculino com o nome inesquecível La Vagina Hídrica»; «quando o Graham Greene me mirou com aqueles olhos aguados, censurando o meu mais do que óbvio agnosticismo, percebi que Ferreira Alves jamais seria um nome da literatura universal»; «um dos grandes privilégios da minha vida foi ter partilhado com John Le Carré, num incaracterístico bar de hotel das Docklands, a paixão do whisky com soda»; «isto depois da noite tempestuosa em que até de madrugada discuti os direitos humanos em Cuba com Gabo»; «de passagem por Lisboa, Dostoievski telefonou para o jornal à minha procura. Por azar, o meu telemóvel estava sem bateria»; «por vezes, a Sontag irrita-me. Aliás, é recíproco, segundo me disseram»; «o José passou o fim de semana de cara fechada. A Pilar e eu, já tocadas por uns copitos de Marquez de Riestra, Gran Reserva, começámos a disparatar. O José só mostrou os dentes quando, à hora do jantar, nos veio dar a notícia da TV, num sorriso aberto: "Mais um atentado no Iraque, morreram sete americanos". O rosto iluminou-se: "E tinham todos entre 18 e 22 anos de idade!"».

Clara, Repórter de Guerra (esta mete sempre motoristas de táxi e crianças de olhos grandes) - «Abu, o meu fiel motorista («taxi, taxi, lady? Come with Abu!»), levou-me então ao campo dos refugiados. O campo das crianças mortas. Um menino de oito anos, a quem os soldados israelitas tinham tirado a Playstation, olhou-me com a fundura de um ódio de séculos. O ódio que faz levantar muros. Muros de lamentos e sofrimentos, nesta terra eternamente martirizada por uma coisa a que chamam Deus»; «no fim do dia, todos nós, os correspondentes daquela guerra sem sentido, gostávamos de nos sentar à beira da piscina vazia do Walraff’s, a ouvir o som dos morteiros ao longe. O Walraff’s deve ser o único hotel do mundo que tem uma cratera de morteiro na parede do piano-bar. É um lugar onde me sinto bem».

Clara, urbano-depressiva -
«o velho sentado no banco do jardim era um farrapo, uma folha outonal que em breve iria ser varrida da existência humana, sem que ninguém desse por isso, sem ninguém se importasse com isso»; «Alice confessou-me que era professora e via nos alunos que a insultavam e lhe cuspiam para cima o único escape que lhe restava para fugir aos intermináveis domingos da sua solidão»; «naquela inesquecível viagem de comboio para Turim, em que o casal de meia-idade à minha frente não trocou uma só palavra»

Clara, cidadã do mundo - «confesso que fiquei embasbacada quando o Papa, virando-se para a Aura Miguel, perguntou se aquela senhorita ali ao fundo, a fumar Partagas, era a Clara Ferreira Alves»; «cá estou de novo na esplanada do mesmo resort de Bali, com as mesmas americanas obscenamente gordas e os mesmos mafiosos russos rodeados de guarda-costas com Uzis»; «saio de Las Vegas sem saudades daquela amálgama pornográfica de néon e turistas japoneses»; «na esplanada, olho com desprezo a multidão que seguia uma menina com um guarda-chuva amarelo. Agradeci a Deus não ter feito de mim uma turista. Como Chatwin, sou e serei sempre uma viajante».

Clara, na intimidade - «esta semana tive obras em casa. Em Portugal, obras em casa é sinónimo de uma aventura. Uma tempestade doméstica, enfim. Os canalizadores, que disseram que chegavam às nove (“esteja descansada, doutora!”), apareceram ao meio-dia, mal-encarados (“porra, cancelaram a conferência do Derrida na Culturgest!”)»; «fiz uma coisa de que sempre me arrependo: arrumar os livros. Nestas ocasiões, encontro sempre uma edição perdida de Proust ou um Beckett que procurava há anos. Perco-me a folhear as memórias dos meus quinze anos, quando já tinha este complexo de superioridade e julgava que viria a ser uma escritora de expressão mundial – pretensão que, de resto, ainda não abandonei por inteiro».

Clara-caprichosa, és tremendamente snob. Mas essa até te desculpamos. Todos sabemos que o snobismo é a forma de disfarçares a banalidade pequeno-burguesa do teu nome, de que te envergonhas. A tua petulante altivez esconde um drama profundo: tens um apelido compósito («Ferreira Alves») que parece marca de vinho branco para temperar a carne. Tara perdida.”

Do caroço da civilização encarnado em VPV à snobeira “ un peau estrionique” de CFA prefiro caracóis e uma imperial !
Jorge Matos

4 comentários:

  1. Será que é a Constança que anda com ciúmes? É que quanto mais me bates mais eu gosto de ti.

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  2. Belas montagens fotográficas. Grande blog.

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  3. Tiro o chapéu a este post.
    Parabéns.

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  4. EXCLUSIVO: A crónica que Clara Ferreira Alves vai publicar no Expresso do próximo sábado veio ter à caixa de correio do Gato Fedorento por extraordinário bambúrrio. (Evidentemente, a frase anterior não passa de um pretexto para usar a palavra bambúrrio, pela qual sempre nutri especial afeição.) O Gato Fedorento não resiste a publicar antecipadamente o texto:

    Ontem, pus-me a pensar no meu amigo Salman. Tenho saudades dele. Ir visitá-lo a Londres é complicado. A agenda dos grandes escritores é muito preenchida, mas ele aceita bem isso e não me leva a mal. A outra hipótese era ele vir visitar-me a mim, mas os seguranças não me cabem cá em casa por causa dos livros. A propósito, há mais de duas crónicas que não escrevo isto: eu tenho imensos livros, não se esqueçam. De modo que falamos quase sempre por telefone. Foi assim que lhe ditei os últimos dois capítulos do Fury. O pior foi quando chegou a conta da PT. Salman, arranja um e-mail, por favor!
    Para me distrair, reli pela 3486ª vez a Madame Bovary. A insatisfação de sempre: as margens da minha edição são demasiado estreitas, e não tenho espaço para fazer todas as emendas de que a prosa do Flaubert precisa. Ainda no outro dia me dizia o Zé: “Ó Clara, quando é que acabas de me rever o romance?” E eu: “Tem calma, Zé. Isto está uma salgalhada sem interesse nenhum. Se eu não te tenho posto as mãos n’ O Ano da Morte de Ricardo Reis para dar a volta àquilo, tinhas publicado um livro sobre o heterónimo do António Aleixo que era canalizador.” Coitado do Zé. É um simplório, mas eu gosto dele. Tem muita sorte se lhe entregar o livro a tempo de sair no Natal, por causa das obras. Quero voltar a pintar a casa daqui a três anos, o que significa que tenho que começar já a empacotar os livros, para que possam estar todos devidamente acondicionados em 2006. Não sei se já disse, mas eu tenho muitos livros.
    Como me apetecia descontrair, reli o Guerra e Paz em 25 minutos, enquanto jantava. Depois fez-se tarde e deitei-me. Pus-me a dar uma vista de olhos a uma colecção de New Yorker antigas que o Martin Amis me ofereceu. Tudo muito ligeirinho, são boas para acender o lume. Não sei como é que há gente que copia aquilo.
    Apago a luz para dormir mas ainda não é desta: à meia-noite em ponto entra-me no quarto o fantasma do Shakespeare. Às segundas, quartas e sextas, aparece em minha casa; às terças, quintas e sábados aparece na do Harold Bloom. “Que queres desta vez, William?” Normalmente vem pedir-me por tudo para que eu não publique os meus romances, senão ele deixa de ser a figura mais admirada de sempre da literatura mundial. Até agora tenho feito a vontade ao velho Bill, mas já não vou tendo gavetas onde guardar tanto manuscrito genial. Porém, desta vez, o problema é outro: perdeu a minha crónica da semana passada e quer saber se eu lhe arranjo uma cópia. O Chaucer, o Marlowe e o Donne querem passar um bom naco da eternidade a discutir as minhas teorias sobre o expressionismo alemão e ele, como não leu o texto, está fora da tertúlia. “Toma lá e vai-te embora, pá. Deixa-me dormir.” Ele lançou-me um olhar de admiração e inveja e desapareceu.
    Só mais uma coisa, para o caso de não terem percebido onde é que eu queria chegar com esta história: neste país, toda a gente é idiota menos eu e os meus amigos. E mesmo pelos meus amigos eu não ponho as mãos no fogo. RAP
    Gato Fedorento

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