Não sou um leitor de poesia arejado, mas gosto de associar poemas a imagens, mesmo no caso em que o apelo da comunicação é linear, não envolvendo grandes efeitos estéticos ou signos linguísticos.
Ontem, fi-lo noutro blog e procurei questionar a essência duma leitura fruída com prazer mas, aparentemente dissonante.
Veio-me à memória o meu primeiro amor. Tinha na contracapa de todos os cadernos o poema Dez réis de esperança.
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Ontem, fi-lo noutro blog e procurei questionar a essência duma leitura fruída com prazer mas, aparentemente dissonante.
Veio-me à memória o meu primeiro amor. Tinha na contracapa de todos os cadernos o poema Dez réis de esperança.
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Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos á boca
e viesse o que viesse.
Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela
,não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.
António Gedeão
António Gedeão
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Guardei o sorriso, as conversas de alpendre, abraços em relvados verdes de esperança e algumas contorções de êxtase.
Pensei perceber, de alguma forma, o sentido deste culto associativo.
O seu rosto perdeu-se na profusão dos dias. Lembrei-me da vida como originária de uma combinação de moléculas, da tabela periódica (facto estranho!), da combinação das emoções ao longo da vida, das coisas que se perdem e da complexificação dos sentimentos e dos signos.
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Pensei perceber, de alguma forma, o sentido deste culto associativo.
O seu rosto perdeu-se na profusão dos dias. Lembrei-me da vida como originária de uma combinação de moléculas, da tabela periódica (facto estranho!), da combinação das emoções ao longo da vida, das coisas que se perdem e da complexificação dos sentimentos e dos signos.
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NOUTROS LUGARES
Não é que ser possível ser feliz acabe,
quando se aprende a sê-lo com bem pouco.
Ou que não mais saibamos repetir o gesto
que mais prazer nos dá, ou que daria
a outrem um prazer irresistível. Não:
o tempo nos afina e nos apura:
faríamos o gesto com infinda ciência.
Não é que passem as pessoas, quando
o nosso pouco é feito da passagem delas.
Nem é tanto que ao jovem seja dado
o que a mais velhos se recusa. Não.
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É que os lugares acabam. Ou ainda antes
de serem destruídos, as pessoas somem
e não mais voltam onde parecia
que elas ou outras voltariam sempre
por toda a eternidade. Mas não voltam,
desviadas por razões ou por razão nenhuma.
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É que as maneiras, modos, circunstâncias
mudam. Desertas ficam praias que brilhavam
não de água ou sol mas solta juventude.
As ruas rasgam casas onde leitos
já frios e lavados não rangiam mais.
E portas encostadas só se abrem sobre
a treva que nenhuma sombra aquece.
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O modo como tínhamos ou víamos,
em que com tempo o gesto sempre o mesmo
faríamos com ciência refinada e sábia
(o mesmo gesto que seria útil,
se o modo e a circunstância permitissem),
tornou-se sem sentido e sem lugar.
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Aonde e como? Aonde e como? Quando?
Em que praias, que ruas, casas e quais leitos,
a que horas do dia ou da noite não sei.
Apenas sei que as circunstâncias mudam
e que os lugares acabam. E que a gente
não volta ou não repete, e sem razão, o que
só por acaso era a razão dos outros.
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Se do que vi ou tive uma saudade sinto,
feita de raiva e do vazio gélido,
não é saudade, não. Mas muito apenas
o horror de não saber como se sabe agora
o mesmo que aprendi. E a solidão
de tudo ser igual doutra maneira.
E o medo de que a vida seja isto:
um hábito quebrado que se não reata,
senão noutros lugares que não conheço
Jorge de Sena
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AMARCORD
Jorge de Sena
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AMARCORD
Não te sabia tão poético e romântico, ou este post significa a comemoração de algo? Hum, hum?...
ResponderEliminarOu então não me digas que vais criar um blog exclusivamente dedicado à poesia. Abraço.
Não, este post tão intimista não é, não pode ser do Kaos!
ResponderEliminarOlha, AMARCORD, acho que captei bem o sentido do teu post ainda que por razões completamente diversas das tuas: um dia, já mais tarde um professor perguntou se tínhamos sentido trágico. Muitas não sabiam mas eu vi-me impelida a responder que sim. E num momento me lembrei de como, com 12, 13 anos?, antes mesmo de conhecer o amor, gostava de ficar a chorar lágrimas verdadeiras, daquelas como as do Pessoa, enquanto ouvia o Chico no gira-discos cantando: "ó pedaço de mim, ó metade arrancada de mim..."
É que eu também amo poemas, imagens, associações (menos as secretas, como a Opus Dei!).
(E o Alentejo, para quando?)
Bjecas, fika bem!
seja de quem e for e pelo que for, gostei e muito deste momento de rara beleza e bom gosto das escolhas. (Ai como é bom saber escrever assim, como eles!)
ResponderEliminarPor mim agradeço ao sentir-me tão bem.
Jinhos
Mentecapto:
ResponderEliminar:) Não, realmente não sou nem ando assim tão poético. Talvez não tehas reparado mas o post está assinado pelo meu grande amigo AMACORD. É sempre bom colocar textos com alguma qualidade aqui.
abraço
Kaotica:
ResponderEliminarEssa fica para o Amacord responder
bjos
TB:
ResponderEliminarFelizmente tenho a sorte de ter alguns amigos que dão algum nivel a este blog. Ainda bem que te agradou
bjos
Tenho pena de não ter a mesma sorte para o mesmo acontecer lá no linhas...(mas ele já teve a honra de receber tão ilustre amigo):)
ResponderEliminarJinhos