terça-feira, janeiro 24, 2006

So ares e ventos de mudança


Folhear a imprensa local às vezes pode ser gratificante. Principalmente se é antecedente à eleição presidencial deste nosso portugalezinho meio alaranjado ( faz lembrar a Meia-Laranja, até é familiar, fica bem), meio descontente da outra metade estar podre. Mas o que encontrei eu na imprensa regional? O relato de uma arruada feita mesmo aqui no Mercado Municipal Algés por Mário Soares, cujo optimismo era ipsis verbis o que Mourinho vende no anúncio do BPI - «"se não fosse para ganhar eu não estaria aqui"». Aspas de aspas, Soares usa as palavras de Mourinho para mostrar confiança aos populares. Propaganda política sobre propaganda bancária, sobre propaganda pessoal, e muito optimismo à Soares. Este optimismo gaiato mas não de todo inocente, que soou ridículo aos ouvidos do publicuzinho ensinado a rir dos idosos, valeu-lhe uma derrota two in one a favor de Cavaco e de Manuel Alegre. Mas não foi só isso. O Soares das meias tintas tornou-se uma imagem gasta. Soares já não é o presidente de todos os portugueses. É um Soares demasiado de esquerda para agradar aos direitistas; um Soares com um passado demasiado triste para a esquerda , e contaminado pelo apoio público de um governo impopular. Além disso a esquerda tinha muito mais em quem votar. Soares não podia desta vez agradar a gregos e a troianos, por isso teve e a votação que teve. Só os fiéis ao soarismo o acompanharam na sua loucura fixe. E mesmo esses a sós nas urnas devem ter feito outras escolhas. Muitos votaram Manuel Alegre deliberadamente para que não fosse Soares a ir a uma segunda volta, outros se calhar votaram mesmo no Cavaco. Por isso Manuel Alegre teve a votação que teve e também por se apresentar sem apoio partidário. A sua maior falha foi não se ter apresentado como candidato mais cedo, para deixar o PS de Sócrates ainda mais comprometido se insistisse em arranjar outro candidato como fez. De Manuel Alegre guardemos a ideia da aposta numa cidadania mais empenhada em defender os seus direitos, a convicção numa política mais social. De Mário Soares conservemos a memória de que manteve a vitalidade até ao fim da sua campanha, que só o rejuvenesceu, e do debate que teve com Cavaco Silva no qual nua e cruamente procurou lembrar aos portugueses quem realmente é Cavaco Silva. Foi um candidato necessário. Ousou erguer a voz contra Cavaco Silva e contra o cavaquismo e não lhas popou. Além disso recolheu votos que sem ele provavelmente teriam ido parar a Cavaco Silva. Por isso lhe perdoamos as suas falhas, mas só as de memória, não as de outros tempos quando negociava acordos com a CEE mais o "mon ami Miterand". Damo-nos por felizes por termos tido outras escolhas. Se bem que antes queria engolir outro sapo destes do que ter que mamar com a múmia de Boliqueime à frente dos destinos de Portugal. Soares também não queria a múmia e isso marca um ponto a seu favor. Ficamos à espera que Soares possa continuar a dizer a frase de Mourinho, mas noutras circunstâncias. E que desta vez a use relativamente a ganhar juízo.

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